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terça-feira, 8 de abril de 2014

Atrasadas, obras da Transnordestina em PE prejudicam porto de Suape


Quando as obras da ferrovia Transnordestina começaram, em 2006, a previsão era que fossem concluídas em 2010. Porém, uma série de entraves com desapropriações e alterações de projeto, além de questões ambientais, fizeram o prazo ser estendido para setembro de 2016, segundo o Ministério dos Transportes – totalizando dez anos de obra, em vez dos quatro iniciais. Os adiamentos e a falta de informação fazem a população e empresários do Sertão de Pernambuco, por onde os trilhos vão passar, não saberem o que esperar do futuro.
Há três trechos ainda em obras. Em um deles, entre Salgueiro e Suape, são previstos 306 quilômetros em obras, estando prontas atualmente 55% da infraestrutura, 53% das obras de arte especial e 35% da superestrutura.
"Suape receberia grandes navios, que fariam o transbordo para navios pequenos e outros modais, e a ferrovia é um dos fatores determinantes. Não existe no mundo um grande porto sem uma grande ferrovia", aponta o secretário de Desenvolvimento Econômico do estado, Márcio Stefanni.
O secretário informou que, ano passado, Suape bateu o recorde de movimentação de cargas, com 12,8 milhões de toneladas. A expectativa é que a ferrovia aumente essa circulação. "Junto com a Refinaria [Abreu e Lima, obra da Petrobras], essa quantidade subiria, inicialmente, para 30 milhões de toneladas", afirmou.


Abandono
A obra da Transnordestina estava orçada inicialmente em R$ 4,5 bilhões, mas o último reajuste fez o orçamento chegar a R$ 7,5 bilhões. O cenário geral é de abandono, com as pessoas podendo chegar junto aos trilhos e canteiros de obras, todos paralisados.
Inicialmente, a ferrovia seria construída pelo governo federal, mas, por falta de verba e outros entraves, o projeto foi entregue para a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), que criou a empresa Transnordestina Logística S.A. (TLSA) para ser concessionária da obra. O governo federal então firmou compromisso de garantir financiamentos de bancos e órgãos públicos. Já os estados envolvidos ficaram responsáveis pelas desapropriações.
De acordo com o governo federal, o projeto prevê 2.304 quilômetros de ferrovia, beneficiando 81 municípios – 19 no Piauí, 28 no Ceará e 34 em Pernambuco.
Em janeiro, o G1 mostrou que as obras da ferrovia Transnordestina no sertão do Piauí, que já consumiram R$ 1,075 bilhão, estão paralisadas e abandonadas desde setembro de 2013. No Ceará, só 4% das obras no trecho entre a cidade de Missão Velha e o Porto do Pecém, na Grande Fortaleza, estão concluídas, segundo o Ministério dos Transportes.
Nesta terceira reportagem da série, a reportagem do G1 percorreu, em Pernambuco, mais de 1.500 quilômetros, do Recife até Araripina, de onde a ferrovia segue para o Piauí. No caminho, encontrou obras paradas e a população em compasso de espera.
O trecho mais avançado são os 163 quilômetros entre Salgueiro e Trindade. Nessa parte, estão prontos, segundo o Ministério dos Transportes, 99% da infraestrutura (obras de aterramento e nivelamento, antes de colocação da ferrovia propriamente dita), 98% da obra de arte especial (pontes, viadutos e túneis, entre outros) e 70% da superestrutura (dormentes e trilhos). Os trilhos podem ser vistos em Terra Nova e Parnamirim mas, a partir de Ouricuri, há apenas indicação de que ali, um dia, houve um canteiro de obras: sobram placas caídas no chão e muita poeira.
Já entre Trindade e Eliseu Martins, no Piauí, são 259 quilômetros de obras, estando prontas 42% da infraestrutura e 35% da obra de arte especial.
Obras

O movimento de caminhões em uma fábrica de dormentes em Salgueiro foi o único sinal encontrado de obras em andamento no trecho da Transnordestina em Pernambuco. No resto do trajeto, em 12 municípios, o G1 encontrou canteiros de obras e partes prontas – mas nenhuma máquina ou operário.

Os sinais são de uma obra parada e sem uso: no trecho de 96 quilômetros que segue de Salgueiro para o Ceará – o único pronto no estado até agora, inaugurado em agosto de 2013 – há muitos vagões parados e sem segurança. Perto dali, um grupo de homens levava um pedaço de trilho – segundo a TLSA, uma “sobra” de trilho.
Em Araripina, a ponte já construída não tem trilhos e vem servindo para a população como um acesso mais rápido para propriedades rurais do distrito de Nascente, localizado a mais de 35 quilômetros do centro do município. “Eles tomaram os caminhos, cortaram a estrada. Não sei como vai ficar depois. O outro acesso é muito mais distante”, explica Ivanildo Rocha, que foi um dos operários dispensados em setembro.
Em São José do Belmonte e em Salgueiro, os trilhos viraram estrada para a população, que segue a pé ou a cavalo.
 Trilhos vão passar a poucos metros da casa de Rosélia
Vieira. (Foto: Katherine Coutinho/G1)
Mecânico Heleno Belarmino não entende porque as obras
foram paralisadas. (Foto: Katherine Coutinho/G1)

Questionada pelo G1 sobre o andamento das obras, a TLSA informou que " a construção da ferrovia Transnordestina está em curso e terá seu ritmo intensificado nas próximas semanas. Estão sendo mobilizadas novas equipes, equipamentos e materiais para as novas frentes de trabalho que estão sendo instaladas". Inconclusa, a Transnordestina frustra o sonho de Pernambuco ter o terceiro maior porto do país, atrás apenas dos terminais de Santos, em São Paulo, e do Rio de Janeiro.
Incertezas
Morando no distrito do Sítio Abóbora, em Trindade, a agente de saúde comunitária Rosélia Vieira viu o sossego da pequena propriedade rural terminar. O terreno é cortado pela obra de ferrovia, que passa a 4,5 quilômetros da BR-316, mas atualmente nenhuma máquina trabalha no local. A poeira fez com que os irmãos de Rosélia deixassem de fazer placas de gesso, indo trabalhar para outras pessoas. Porém, a preocupação maior é com o dia em que as obras forem rachada desde que as obras começaram. Não posso nem mais criar meus animais, porque eles tiraram minha cerca", lamenta a agente de saúde, que não sabe como vai ficar o acesso à própria casa quando a obra for concluída. Morando com a esposa e dois filhos em um pequeno sítio em Ouricuri, o agricultor e carpinteiro Arlei Marques Torres viu a entrada da propriedade virar uma ladeira íngreme quando as obras da Transnordestina passaram pelos fundos do terreno. "Quando os rolos para acertar o terreno passavam, tremia tudo aqui em casa. Caíam os copos e pratos do armário. Imagina quando for o trem?", questiona o agricultor.

A casa do mecânico Heleno Belarmino da Silva, no Sítio Pitombeira, distrito de Custódia, fica a 40 metros dos trilhos da ferrovia. Durante dois anos e sete meses, ele foi funcionário da obra. Com o dinheiro, construiu uma pequena borracharia no terreno onde mora – que é como se sustenta atualmente. "É um absurdo uma obra dessas parar. A gente sabe que deve trazer benefícios para todos, só não se sabe direito como vai ser", admite.
Entre março de 2009 e dezembro do ano passado, 1.952 desapropriações referentes à Transnordestina foram realizadas em Pernambuco, de acordo com a Secretaria de Desenvolvimento Econômico. O total gasto com as indenizações soma R$ 28,9 milhões. A pasta informou que 258 desapropriações ainda serão feitas, divididas entre os municípios de Belém de Maria, na Mata Sul; Cachoeirinha e Pesqueira, no Agreste; ArcoverdeCustódiaSerra Talhada, Salgueiro, Parnamirim e Trindade, no Sertão. Esse número não leva em consideração os trechos chamados SPS-08 e SPS-09, entre Belém de Maria e Suape, que ainda estão tendo os traçados aprovados pelo projeto.
No distrito de Varzinha, em Serra Talhada, ferrovia passará próxima às casas. (Foto: Katherine Coutinho/G1)
Perspectiva

Com as obras da Transnordestina concluídas no município, Salgueiro viu uma diminuição drástica do número de pessoas circulando pela cidade. Restaurantes, hotéis e pousadas que investiram para atender a demanda de quase 15 mil novos moradores durante a construção da ferrovia estão tendo que se adaptar à nova realidade – embora a expectativa de um aeroporto na cidade e de outras obras ajude a criar esperanças. O empresário Edmilson Torres Sá investiu em um restaurante em 2010. Durante o auge das obras, chegou a vender 1.500 refeições por dia e a ter 15 funcionários no estabelecimento, às margens da BR-232. Atualmente, são aproximadamente 500 refeições diárias e o número de empregados foi reduzido para seis, a maioria de pessoas da família. "A gente fica preocupado com o futuro, o fluxo da cidade caiu muito. Era muito carro aqui em Salgueiro, um trânsito que você não acreditava", lembra. 
Com a baixa, uma pousada no centro de Salgueiro aproveita para fazer as reformas necessárias. "Teve tempo aqui de a gente ver pessoas dormindo nos carros, porque não tinha lugar nas pousadas", lembra o gerente, Vandelvo Pereira. O movimento menor preocupa um pouco, mas as perspectivas são boas. "Dizem que vão retomar as obras, que vêm outras", explica. O verdureiro Claudir Codeiro trabalha há anos junto do Mercado Municipal de Salgueiro. Com o final das obras da ferrovia, estima que as vendas diminuíram em, pelo menos, 40% mensalmente. "Depois que terminou, está muito difícil para nós. Juntando a seca com o final das obras, estou tendo que buscar verdura em Juazeiro, na Bahia, para valer a pena vender. O salgueirense apostou, mas sem as empresas? Não tem como ter retorno. O jeito é gastar menos, reduzir as contas", explica. Outras pessoas são mais otimistas. Dono de uma oficina e outros estabelecimentos, Francisco de Sá Parente transformou os pequenos quartos que tinha em um hotel. "É uma pequena tragédia para o melhor. Tinha 'inchado' demais e agora estamos voltando para a realidade. Estamos a cerca de 600 quilômetros de todas as capitais do Nordeste, somos um centro logístico com potencialidade", acredita o empresário. 

Fpnte: (G1)


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